Após o apagão que deixou mais de 3 milhões de pessoas sem energia na Grande São Paulo, a Enel defendeu que os subsídios concedidos à energia solar fossem reavaliados. Segundo a distribuidora, parte desses incentivos deveria ser redirecionada para fortalecer a resiliência das redes elétricas e, eventualmente, reduzir as tarifas. A declaração, feita por Guilherme Lencastre, presidente da Enel, gerou críticas no setor de energia solar, que acusou a empresa de desviar o foco do apagão e atacar a concorrência com as renováveis.
Durante a coletiva de imprensa na última quinta-feira (17/10), Lencastre criticou os subsídios à geração distribuída, apontando que os incentivos atuais estão pesando no bolso das famílias. “Os clientes que não têm condição de colocar painel solar estão pagando a conta daqueles que têm. Esse gerador não precisa mais desse incentivo”, afirmou. Ele sugeriu que a redução dos subsídios poderia beneficiar as distribuidoras, permitindo investimentos em melhorias para evitar futuras falhas na rede elétrica.
A posição de Lencastre encontra eco na Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), que considera que os subsídios geram custos para outros consumidores. Segundo Marcos Madureira, presidente da Abradee, os setores beneficiados pelo incentivo não pagam pelo uso do sistema elétrico. “O incentivo é válido enquanto necessário, mas é preciso pagar pelo uso do sistema”, argumentou.
A reação do setor solar foi imediata. Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), classificou as declarações como “infundadas” e apontou um “conflito de interesse” por parte das distribuidoras. Sauaia destacou que os subsídios foram aprovados por consenso entre os setores e o Ministério das Minas e Energia. “É lamentável que um presidente de distribuidora use uma entrevista para tentar desviar o foco das falhas que deve explicar à sociedade”, criticou.
A Absolar também rebateu a alegação de prejuízos aos consumidores, citando um estudo que prevê uma economia de R$ 84,9 bilhões até 2031 com os benefícios da geração distribuída, incluindo a redução do uso de termelétricas e a preservação de água nos reservatórios das hidrelétricas.
Os incentivos à geração distribuída, especialmente para energia solar, representam R$ 8,5 bilhões em 2024, o que equivale a 25,76% de todos os subsídios na energia elétrica neste ano. A Aneel estima que esses benefícios acrescentem, em média, 12,62% à tarifa dos consumidores residenciais. Porém, Sauaia argumenta que os cálculos apresentados são parciais e não consideram os impactos positivos na redução de custos com geração térmica e economia hídrica.
O debate expõe uma tensão crescente entre distribuidoras e o setor de energia solar, em um momento em que a demanda por fontes renováveis cresce e os consumidores buscam alternativas para economizar na conta de luz.